Inácio: "Deus parece ter lhe negado o dom da sutileza."
"..o excesso de alvos também provoca dispersão. Porque além de tudo isso temos os sentimentos em questão…"
Estranho filme, o novo “Robocop”. Se fosse comparar com o primeiro, seria constrangedor, mas não humilhante. Agora, parece um filme feito à feição de José Padilha. É quase um Tropa de Elite em ficção científica.
Todos os elementos estão lá: a violência nas ruas, a corrupção policial, o tráfico (de armas, no caso), a solidão do herói, a fraqueza dos políticos, a influência da mídia, o poder das grandes corporações.
Se Padilha foi contratado para o filme, no mínimo chegou lá para interferir no roteiro. Ou fizeram um roteiro como lhe conviria. Enfim…
Talvez a roda pegue numa questão: o excesso de pontos a focar. Como se vê pela enumeração acima, Robocop vai do bandido na rua à grande corporação. Dá uma esquadrinhada com olhos cibernéticos, como o robô policial, mas fica tudo um pouco disperso, ao mesmo tempo.
Daí a profusão de vilões. Hitchcock dizia que um bom filme depende de um bom vilão.
Ok, é uma visão clássica. Não dá para sustentá-la muito bem no mundo atual se você pretende ser sério, e Padilha pretende.
Mas o excesso de alvos também provoca dispersão. Porque além de tudo isso temos os sentimentos em questão…
De todos os vilões do filme, o mais significativo me parece que é Novak, o apresentador de TV, uma espécie de Datena que fica cutucando o poder para que se tenha mais polícia, mais polícia, mais lei e ordem etc. Paranóia de segurança. A luta de Novak é por nossas consciências.
Mas Novak trabalha para o magnata dos drones, o cara da corporação, aquele que se beneficia da ação de Novak, por exemplo.
Existem os policiais corruptos, que armam para os honestos. Como sempre nos filmes de Padilha. E o cientista que monta Robocop não deixa de ser um sádico (movido pela curiosidade e tal, mas que importa?).
O que melhor cumpre as funções de vilão é mesmo um segurança a serviço do magnata, que vê em Robocop um concorrente. Quer eliminá-lo pela humilhação.
Chama-o de Homem de Lata. Para quem não lembra, o personagem de “O Mágico de Oz”. Mas ele é um personagem apenas lateral, que se não existisse não mudaria nada.
Transportado aos EUA, o estilo Padilha não se altera: Deus parece ter lhe negado o dom da sutileza.
Volto logo: tem uma penca de estreias por aí.
Trailer:
O filme dos Coen, esquecido pelo Oscar (ou quase): gosto bastante, nada oportunista.
“12 Anos de Escravidão”: é o filme “já ganhou” do ano. Não me interessou nada: acadêmico até onde é possível.
“Coutinho”: vale a pena.
**
Sobre o autor: Inácio Araujo é crítico de cinema da Folha e autor de dois livros sobre o assunto: “Hitchcock, o Mestre do Medo” e “Cinema, o Mundo em Movimento”, além de participar de diversas coletâneas.
É escritor, autor do romance “Casa de Meninas” (prêmio APCA de autor revelação, 1987, em 2a. ed. pela Imprensa Oficial do Estado/SP), do romance juvenil “Uma Chance na Vida”.
Uma seleção de seus textos na Folha foi organizada por Juliano Tosi, com o título de “Críticas de Inácio Araujo” (ed. Imprensa Oficial de SP). Lança em 2014 o livro de contos “Urgentes Preparativos para o Fim do Mundo” (ed. Iluminuras).
**
Mais críticas: http://inacioaraujo.blogfolha.uol.com.br/
Todos os elementos estão lá: a violência nas ruas, a corrupção policial, o tráfico (de armas, no caso), a solidão do herói, a fraqueza dos políticos, a influência da mídia, o poder das grandes corporações.
Se Padilha foi contratado para o filme, no mínimo chegou lá para interferir no roteiro. Ou fizeram um roteiro como lhe conviria. Enfim…
Talvez a roda pegue numa questão: o excesso de pontos a focar. Como se vê pela enumeração acima, Robocop vai do bandido na rua à grande corporação. Dá uma esquadrinhada com olhos cibernéticos, como o robô policial, mas fica tudo um pouco disperso, ao mesmo tempo.
Daí a profusão de vilões. Hitchcock dizia que um bom filme depende de um bom vilão.
Ok, é uma visão clássica. Não dá para sustentá-la muito bem no mundo atual se você pretende ser sério, e Padilha pretende.
Mas o excesso de alvos também provoca dispersão. Porque além de tudo isso temos os sentimentos em questão…
De todos os vilões do filme, o mais significativo me parece que é Novak, o apresentador de TV, uma espécie de Datena que fica cutucando o poder para que se tenha mais polícia, mais polícia, mais lei e ordem etc. Paranóia de segurança. A luta de Novak é por nossas consciências.
Mas Novak trabalha para o magnata dos drones, o cara da corporação, aquele que se beneficia da ação de Novak, por exemplo.
Existem os policiais corruptos, que armam para os honestos. Como sempre nos filmes de Padilha. E o cientista que monta Robocop não deixa de ser um sádico (movido pela curiosidade e tal, mas que importa?).
O que melhor cumpre as funções de vilão é mesmo um segurança a serviço do magnata, que vê em Robocop um concorrente. Quer eliminá-lo pela humilhação.
Chama-o de Homem de Lata. Para quem não lembra, o personagem de “O Mágico de Oz”. Mas ele é um personagem apenas lateral, que se não existisse não mudaria nada.
Transportado aos EUA, o estilo Padilha não se altera: Deus parece ter lhe negado o dom da sutileza.
Volto logo: tem uma penca de estreias por aí.
Trailer:
O filme dos Coen, esquecido pelo Oscar (ou quase): gosto bastante, nada oportunista.
“12 Anos de Escravidão”: é o filme “já ganhou” do ano. Não me interessou nada: acadêmico até onde é possível.
“Coutinho”: vale a pena.
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Sobre o autor: Inácio Araujo é crítico de cinema da Folha e autor de dois livros sobre o assunto: “Hitchcock, o Mestre do Medo” e “Cinema, o Mundo em Movimento”, além de participar de diversas coletâneas.
É escritor, autor do romance “Casa de Meninas” (prêmio APCA de autor revelação, 1987, em 2a. ed. pela Imprensa Oficial do Estado/SP), do romance juvenil “Uma Chance na Vida”.
Uma seleção de seus textos na Folha foi organizada por Juliano Tosi, com o título de “Críticas de Inácio Araujo” (ed. Imprensa Oficial de SP). Lança em 2014 o livro de contos “Urgentes Preparativos para o Fim do Mundo” (ed. Iluminuras).
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Mais críticas: http://inacioaraujo.blogfolha.uol.com.br/